sábado, 31 de outubro de 2009

O fim de uma estupidez homérica

por Conceição Lemes

O presidente Barack Obama anunciou nessa sexta-feira o fim da lei que proíbe a entrada nos Estados Unidos de pessoas infectadas pelo HIV, o vírus da aids.

A nova legislação começa a valer no início de 2010. Leva o nome de Ryan White, adolescente infectado numa transfusão de sangue que lutou contra a discriminação aos soropositivos. Segundo Obama, a medida ajudará a “eliminar o estigma da doença”.

“Esse anúncio revela a 'vanguarda do atraso' ou o 'cúmulo da hipocrisia' dos estadunidenses”, avalia a mestre em Ciências Sociais pela Escola Nacional de Saúde Pública Marlene Zornitta, psicóloga do Programa de HIV/Aids da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Primeiro, colocam a lei, para reforçar o preconceito. Agora retiram como se fossem up-to-date [atualizados]!”

“Eu ficaria envergonhada se esse anúncio 'grandioso' fosse feito pelo presidente Lula”, prossegue . “Seria mais adequado o Obama eliminar já na prática a lei e comunicar, lamentando pelo atraso – fruto do preconceito – do governo anterior."

PROIBIÇÃO DE 22 ANOS PROVOCOU MUITO SOFRIMENTO
A proibição à entrada de estrangeiros HIV-positivos nos Estados Unidos vigora desde 1987. Portanto, há 22 anos.

Porém, no final dos anos 80 já se sabia que o HIV não “voava” nem “pulava” de uma pessoa para a outra. Os modos de transmissão do HIV estavam bem estabelecidos: sangue, sêmen/fluido vaginal e leite materno.

Além disso, desde o advento dos“coquetéis” antirretrovirais – 1996, lá, 1997, aqui – , a aids é controlada e se tornou uma doença crônica.

“Essa proibição provocou muito sofrimento e angústia em pessoas que, por força do trabalho, tinham de ir para os EUA”, relembra Marlene. "As pessoas estavam bem, se tratando, trabalhando, mas se fossem 'pegos' teriam que voltar e aí, provavelmente, o que haviam conseguido manter em segredo até então, se tornaria publico -- pelo menos no seu trabalho.”

Explicamos. Já na entrada, os soropositivos mentiam no formulário obrigatório respondido para o serviço de migração. Há uma pergunta explícita: você tem alguma doença infecto-contagiosa? Depois, com medo de serem flagrados, carregavam os comprimidos na bagagem de mão em frascos de “vitaminas”, por exemplo. É que, se achassem na bagagem antirretrovirais, tinham de voltar ao país de origem. Se precisavam ficar mais de uma semana lá, a situação se complicava bastante, pois no início da fase dos “coquetéis” eram muitos comprimidos/cápsulas por dia – em média, 10 a 12; alguns chegavam a 30 a 35.

“Os pacientes ainda ‘escondem’ a medicação. Porém, nos últimos anos, não têm tanta ‘nóia’ por mentir. Pelo que eles me contam, na prática, até lá, a tal ‘ pergunta’ já estava sendo ignorada”, afirma a psicóloga Marlene Zornitta. “Essa proibição retrógrada sempre me pareceu um 'sustentáculo' do preconceito.”

Antes tarde do que nunca. Pena que tenham demorado tanto para por fim a essa estupidez homérica.

Fonte: blog viomundo

Linux es el futuro, dice un ex empleado de Microsoft

Por: Franco Catrin / FayerWayer

30 de octubre 2009. - Keith Curtis ingresó a Microsoft en 1993 para incorporarse al equipo de Microsoft Word, en esos años el equipo tenía sólo 20 personas, la misma cantidad que hoy en día Sun mantiene trabajando para OpenOffice completo. Tras retirarse de la compañía después de 11 años, conoció el software que se crea fuera de Microsoft gracias al desarrollo abierto, y presentó sus puntos de vista.

Segun Keith, Windows Vista demostró que Microsoft sigue siendo una compañía enfocada en la ingeniería, y por lo tanto la gente sí se da cuenta cuando las cosas se hacen mal, no es “puro marketing”. Vista causó que muchos usuarios consideraran por primera vez otros sistemas operativos para escritorio como Mac OSX y Linux. Si bien Windows 7 curará las heridas con los usuarios de Windows, es difícil que haga volver a aquellos que hace tiempo abandonaron el sistema.

Keith también dice que los nuevos releases ya no son tan importantes como alguna vez lo fueron. Antes de que las aplicaciones web fueran dominantes, Microsoft necesitaba que los desarrolladores de aplicaciones y partners crearan nuevas versiones para su sistema operativo y que usara las bondades de éste. Así pasó con Windows 95 y la introducción de los 32-bit y multitarea preemptiva, y posterioremente con Windows XP y el kernel de NT.

Para Keith, el hecho de que construir software es complejo para todos, pero la dificultad adicional para Microsoft es mantener la compatibilidad con todo lo que ya existe. Después de haber visto tanto el código de Microsoft como el de otros sistemas, Keith cree que la mayor ventaja de Mac OSX y Linux es que no tienen que cargar con tanto código antiguo.

Aunque Windows 7 no hará que los usuarios de Apple vuelvan, si podría reducir el crecimiento perdido con Vista, y Microsoft perfectamente puede solucionar los problemas que Apple destaca en sus anuncios de PC vs Mac.

Sin embargo, Keith dice que el caso de Linux es diferente, porque puede correr en hardware barato, tiene una gran cantidad de programadores en todo el mundo, menos código obsoleto, un mejor modelo de desarrollo y además se puede conseguir gratis.

Keith también destaca las aplicaciones que vienen en un sistema Linux moderno, como por ejemplo el soporte de múltiples protocolos de mensajería en una sola aplicación (N del E: y OpenOffice). Finalmente destaca una característica que ningún otro sistema tiene: una gran cantidad de aplicaciones libres e instalables con un sólo click.

Aunque muchos programas no están tan bien terminados como Firefox, por nombrar un caso, hay muchos que ya son suficientemente buenos y a diferencia de su competencia, van mejorando a medida de que la base de usuarios crece, gracias a su modelo de desarrollo.

He usado Linux por cuatro años y he visto mejoras drásticas, incluso el ritmo del progreso se incrementa. De hecho, después de varios años investigando sobre el tema, me he convencido de que Linux es el futuro de la computación, así como Wikipedia es el futuro de la enciclopedia.

Después de sus 11 años en Microsoft, Keith Curtis escribió el libro After the Software Wars que también está disponible para descarga. Keith dice que se decidió a escribir el libro cuando dejó Microsoft y comenzó a usar Fedora Core para ver cómo vivía la otra mitad del mundo.

Link: Linux is the future, even after Windows 7 Release (Keith Curtis en TechFlash)

Herança colonial é “turbinada” pelo agronegócio

Eduardo Sales de Lima

da Redação

É consenso que o Brasil possui concentração de terras, excesso de latifúndio. Mas sabe-se também que essa concentração aumentou? O Censo Agropecuário 2006 (que comparou dados de 1996 a 2006) aponta que as pequenas propriedades (com menos de 10 hectares) ocupam apenas 2,7% da área ocupada por estabelecimentos rurais. Já as grandes propriedades (com mais de mil hectares) ocupam 43% da área total. Mas em quantidade, as pequenas propriedades representam 47% do total de estabelecimentos rurais no país, enquanto os latifúndios correspondem a apenas 0,91% desse total.

Sobre o agronegócio, um dado sintomático também em relação à concentração de terras. A soja foi a cultura que mais se expandiu no país na última década. No período entre 1995, quando foi realizado o levantamento anterior, e o censo atual, a soja apresentou um aumento de 88,8% na produção. Em entrevista, Osvaldo Russo, fala do aumento da concentração de terras no Brasil, da soja e de outros assuntos. Ele é estatístico, diretor da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra) e coordenador do Núcleo Agrário Nacional do PT. Foi presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) entre 1993 e1994.

Brasil de Fato – A impressão que se tem é a de que entre 1996 e 2006 houve muita luta social no campo, mas mesmo assim aumentou a concentração. Por quê?

Osvaldo Russo – A concentração escandalosa de terras no Brasil é o retrato da nossa herança colonial e escravista. Em 1996, deu-se o Massacre de Corumbiara (RO). Em 1997, ano do Massacre de Eldorados do Carajás (PA), deu-se a Marcha do MST (100 mil) que ganhou grande destaque nacional e internacional. A mobilização social foi intensa a partir de 1993, quando foram promulgadas a Lei Agrária e a Lei do Rito Sumário, que regulamentaram o capítulo da reforma agrária da Constituição de 1988. No governo FHC, entretanto, foi grande a criminalização do movimento sindical e dos movimentos sociais, em especial do MST.

Ficou provado com o estudo que a pequena propriedade emprega e produz muito mais que o latifúndio. Qual será o peso político dessa informação para que o governo se sinta mais pressionado a fazer a reforma agrária de fato ou, ao menos, faça a atualização dos índices de produtividade?

O Censo Agropecuário de 2006 confirma aquilo que pesquisadores e ativistas vêm dizendo: apesar de representar pouco mais de 30% do total das áreas, os pequenos estabelecimentos respondem por mais de 84% das pessoas empregadas. Os dados também mostram que esses trabalhadores fazem parte da agricultura familiar, cujos 12,8 milhões de produtores representam 77% do total de pessoas ocupadas. As informações do IBGE revelam ainda que a agricultura familiar é mais eficiente na utilização de suas terras, gerando um valor de produção de R$ 677 por hectare, enquanto que a não familiar gera um valor de R$ 358 por hectare. Acredito que esses dados podem contribuir para que governo e sociedade mobilizem e acelerem as mudanças necessárias nas políticas para o campo, dando maior ênfase à reforma agrária e à agricultura familiar. Isso deve ser expresso em maiores recursos para o setor e na adoção de novos índices de produtividade, já que os atuais estão defasados 34 anos.

Os serviços públicos de extensão rural (auxílio técnico) foram desestruturados especialmente na década de 1990. Por quê?

Em primeiro lugar, a extinta Embrater estava aglutinando, como em geral e historicamente as empresas públicas e estatais, uma cultura de política pública de Estado voltada para os interesses nacionais e da maioria do povo brasileiro. O sucateamento da assistência técnica e da extensão rural fez parte da política neoliberal de liquidação do Estado promovida pelos governos Collor e FHC. Em segundo lugar, a desestruturação da assistência aos pequenos agricultores favoreceu ao agronegócio.

Em que pesa mais negativamente a expansão de 63,9% na área de soja no Brasil? É uma cultura que mais amplia a concentração de terras e a dependência econômica num único setor? Mais que a cana?

A expansão da monocultura da soja, da pecuária extensiva e do agronegócio, ao lado da ação criminosa de grileiros e madeireiros na Amazônia e no Centro-Oeste é a responsável pelo crescimento do desmatamento e pela concentração de terras na região. O cultivo da cana-de-açúcar ganhou escala preocupante em São Paulo e em outros estados, o que pode vir a competir com a produção de alimentos internamente se não houver uma regulação, sem o que haverá danos para a soberania alimentar do país.

Foi verificado no censo um intenso uso de agrotóxicos nos estabelecimentos rurais brasileiros. A baixa taxa de assistência e a falta de conhecimento contribuem com o excesso de uso de agrotóxicos?

De um lado, o modelo agrícola hegemonizado pelo agronegócio, com uso de agrotóxicos e sementes transgênicas, é responsável pelo envenenamento da agricultura brasileira. De outro, a ausência de educação ambiental, desde as escolas até a mídia, cria um vazio na conscientização da sociedade, onde o lucro e a ganância prevalecem em detrimento das necessidades de uma alimentação saudável da população brasileira.

Qual década foi mais importante para que tenha ocorrido o aumento da concentração de terras? A de 1990 ou a partir dos anos 2000?

O quadro de concentração fundiária é endêmico na história brasileira. O censo do IBGE mostra que em 2.600 municípios a concentração diminuiu, mas nem por isso ela deixou de ser elevada e de crescer nacionalmente. Os dados revelam a concentração tanto na década de 1990 quanto nesta metade dos anos 2000. Ainda que de 1 milhão de assentamentos realizados no Brasil desde a criação do Incra em 1970, mais da metade se deu de 2003 pra cá, e de o Pronaf ter crescido de pouco mais de R$ 2 bilhões, na safra 2002-2003, para R$ 15 bilhões previstos para a safra 2009/2010, ainda assim nos preocupa a articulação de interesses entre o agronegócio, as grandes empresas multinacionais de insumos e alimentos e os bancos, o que anula qualquer esforço de distribuição da terra.

Da Agência Brasil de Fato

O Rio e a hipocrisia: somos todos culpados.Sandra Crespo explica didaticamente e choca os cínicos e críticos

Sandra Crespo

Cenas de violência e barbárie no Rio de Janeiro voltaram a chocar o Brasil e o mundo nos últimos dias.

Na mídia, policiais e especialistas debatem calorosamente; em locais de trabalho e em rodinhas de amigos, volta a pergunta de sempre: até quando iremos ver tantas cenas aterrorizantes, quantos inocentes ainda vão morrer numa guerra que não é de ninguém? A pergunta que surge a cada invasão de morro e logo some na fumaça do tiroteio pode ainda não ter resposta. Mas não é preciso ser especialista para saber que tanta violência tem nome e sobrenome: crime organizado somado a décadas de ausência do Estado, temperado com a indiferença da sociedade.
De toda a sociedade brasileira, não só a do Rio, nem mesmo apenas a de parcela da Zona Sul que, cínica, compra pó no pé do morro e torce o branco nariz para as obras sociais do operário-presidente nas comunidades pobres.

Carimbam-nas: “obras eleitoreiras”, ao passo que as melhorias em seus bairros turísticos-novelísticos são, ao contrário, necessárias.

Quando voltadas aos pobres, as obras servem apenas para ganhar eleições (aliás, por que pobre vota?). Mas, saindo um pouco da Casa Grande, voltemos à realidade nua e crua.

Pela primeira vez, em décadas, o Rio é beneficiado por medidas do poder público nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal).

Há vontade política dos governantes em solucionar inúmeros problemas urbanos acumulados, há dinheiro investido em iniciativas que visam dar dignidade à favela e ao subúrbio, há experiência positiva — mas ainda incipiente — de comunidades pacificadas.

Leio que o governo federal elabora projeto de lei que retira a pena de prisão para pequenos traficantes que tenham bons antecedentes e não estejam ligados ao crime organizado.

A intenção é evitar que essas pessoas, que muitas vezes traficam para sustentar seus vícios, cheguem à cadeia e sejam cooptadas pelo tráfico — situação verificada na maioria dos casos, segundo a pesquisa que embasa a proposta, encomendada à UFRJ e à UnB. Sim, os governos estão fazendo alguma coisa. É suficiente? Não, precisamos de mais medidas, precisamos de um mutirão. É aí que entra a sociedade.

Na Espanha, o usuário de maconha pode plantar em casa pequenas quantidades da planta para consumo próprio.

A Espanha é um país predominantemente católico e viveu sob ditadura cruenta durante anos. Por que lá pode e aqui não? Porque aqui não ousamos nem mesmo discutir o assunto. Quando o ministro Carlos Minc, num ato de coragem e cidadania, participa de uma marcha pela descriminalização da maconha, recebe sorrisinhos benevolentes à esquerda — “ah, como ele é folclórico” — e insultos à direita.

Nada de discussão séria a respeito do assunto, nem por partidos progressistas como o PT e o PCdoB, tampouco por ONGs que atuam diretamente nas comunidades mais afetadas. Ao tapar os olhos, ao nos negarmos a admitir que esse debate já passou da hora, inclusive quanto aos usuários de drogas pesadas — que deveriam ser tratados como um problema de saúde pública, não de segurança pública —, todos perdemos. Meninos no tráfico, balas perdidas, helicópteros derrubados, corpos jogados em lixeiras e em carrinhos de supermercado.

Estamos errados também nós, não cariocas, que, igualmente vivendo atrás de grades, vidros pretos (não se vê nem vultos através das janelas dos carros no Brasil) e cercas elétricas, consideramos que o problema do Rio é só do Rio.

Devemos ter em mente que o Rio é a cidade-símbolo do Brasil, para o bem e para o mal. É maravilhosa, hospitaleira e alegre, mas também pobre, violenta e corrupta. O que acontece por lá ricocheteia em todas as outras cidades brasileiras.

Devemos lembrar que o narcotráfico começa em fronteiras terrestres, fluviais e aéreas em todos os estados. E as armas, essas também adentram o Brasil do Oiapoque ao Chuí. Ai, as armas... tão amadas por quase 64% de brasileiros — de bem— que disseram não ao desarmamento no referendo de 2005.

Fuzis e metralhadoras, é claro, estão em mãos indevidas. E matam a rodo, destruindo sonhos de jovens e suas famílias indefesas.

Então, será que vamos continuar fumando e cheirando no escurinho, sem mostrar a cara em manifestações e debates sobre a mudança na política sobre drogas; criticando obras sociais por puro preconceito de classe; apoiando armas na ilusão de que assim nos protegemos dos bandidos; fazendo passeata na praia, todo mundo de branco, como se fosse jogar flores para Iemanjá? Brasil, mostra a sua cara: a cara linda e horrenda do Rio de Janeiro.

Do blog Aposentado Invocado

Honduras e o mito da democracia na América Latina


A crise porque passa Honduras a partir do golpe que depôs Manuel Zelaya tem ensejado algumas importantes reflexões sobre a democracia na América Latina. Alguns analistas destacam a relevância do episódio em questão sugerindo que o mesmo destoa de uma suposta consolidação do regime democrático neste vasto continente latino-americano. E justamente por isto tem despertado tanto interesse na opinião pública.

Há, contudo, um pressuposto equivocado nessas reflexões: a idéia de que a democracia estaria hoje consolidada entre nós, na América Latina. Vejamos alguns dos motivos deste equívoco.

Num pequeno livro intitulado Ditadura militar, esquerdas e sociedade (Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2000), o historiador Daniel Aarão Reis questiona a tese – que já se tornou lugar-comum quando se discute o período histórico da ditadura militar no Brasil – de que a sociedade brasileira viveu a ditadura como um pesadelo que é preciso exorcizar, ou seja, a sociedade não tem, e nunca teve, nada a ver com a ditadura.

Segundo esta tese, a sociedade brasileira baniu de uma vez por todas o fantasma da ditadura militar e, afinal, a democracia venceu o autoritarismo. Mas como fica essa tese exposta diante dos questionamentos que Reis formula:

- Se a ditadura foi um pesadelo, foi demonizada, como explicar que não tenha sido escorraçada?

- Como explicar uma anistia recíproca, que alcançou torturados e torturadores numa mesma lei?

- Como explicar que permaneçam com tanta força lideranças e mecanismos de poder preservados e/ou construídos no período da ditadura, pela e para a ditadura?

- Como explicar inúmeras continuidades entre as trevas da ditadura e as luzes da democracia (o latifúndio, o poder dos bancos, a mídia monopolizada, os serviços públicos deteriorados da saúde e da educação, a dívida interna e externa, José Sarney, Delfim Neto e tantos outros)?

- Como explicar a vitalidade da cultura política autoritária tantos anos depois de encerrada a ditadura?

- Por fim, como explicar o fato de que “a ditadura fez-se democracia, como um parto sem dor, sem grandiloqüência ou heroísmo, sem revolução ou morte d’homem”?

Ainda que a sociedade tenha se reconfigurado como uma totalidade que se opôs sempre e maciçamente à ditadura, os questionamentos propostos acima nos levam a perceber o quanto a democracia está por ser construída.

O golpe que deu origem à ditadura não foi apenas militar, contou também com o apoio expressivo de parte da sociedade civil. Essa memória, como ferida aberta, desperta incômodas inquietações que é preciso revisitar.

Outra razão pela qual a democracia permanece um mito entre nós também pode ser extraída do mesmo livro já citado. A ditadura foi resultado do medo. “Medo de que as desigualdades sociais fossem questionadas por um processo de redistribuição de renda e de poder” (p. 73). A maior obra da ditadura talvez tenha sido justamente a de manter e consolidar essas desigualdades. E esse questionamento continua provocando medo. Afinal, não existe democracia onde há desigualdade.

E a desigualdade continua aí, à espreita, a nos desafiar. Diante de profundas desigualdades temos medo do caos ou do retorno a formas autoritárias. Para além do embate travado em Tegucigalpa entre Zelaya e o golpista Micheletti, hoje esse é o dilema vivido em Honduras. Amanhã onde será?

(*) Denilson Botelho é professor de história e autor de A pátria que quisera ter era um mito.

Do blog Fazendo Média

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

A vida de José Serra é enganar os trouxas

José Serra, com apoio do PIG, fez o maior estardalhaço com sua Nota Fiscal Paulista.O PIG não disse que Serra, ao entregar os prêmios aos sorteados, estava fazendo campanha.Para o PIG o que Serra faz é normal. Só que a Nota Fiscal de Serviço-E, que tem o mesmo objetivo da Nota Fiscal Paulista, só não é sorteado prêmio para a população, foi implantada pela Secretaria de Finanças do Recife, no ano de 2008, quer dizer, muito antes da de José Serra. A NFS-e do Recife foi criada para simplificar a vida dos prestadores de serviços e gerar créditos para seus clientes (cidadãos e empresas da cidade de Recife). O cliente (tomador de serviços) que pedir a emissão da NFS-e poderá utilizar parte do ISS recolhido para abater até 50% doIPTU.Portanto, essa ação de Joé Vampiro Serra, assim como foi a da Bunda Larga Popular, foi instituída para enganar os trouxas e para turbinar a sua já perdida eleição presidencial de 2010.

Do blog Terror do Nordeste

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Alemães ricaços querem mais imposto

do blog VIOMUNDO

Por essa (veja na BBC) nossa imprensa partidarizada e nossa classe-média alienada, não esperavam. Bomba no mundo econômico, subvertendo tudo o que a maioria dos afetados do planeta (escpecialmente os "sem noção" do Higienópolis paulistano) sempre ouviu falar sobre economia, capitalismo, trabalhismo e impostos.

Um grupo de ricaços alemães fez um pedido formal à Chanceler Angela Merkell pedindo que o governo AUMENTE OS IMPOSTOS dos que têm mais dinheiro. Eles entendem que se o governo arrecadar mais, poderá investir em programas sociais. E assim, pessoas que estão excluídas do consumo, poderão voltar a gastar dinheiro, fazendo novamente a roda da economia girar.

Não são bons samaritanos querendo dar esmolas como medo de irem para o inferno quando morrerem. São apenas pessoas, capitalistas, que entendem como funciona o jogo. Gente fora do consumo, prejuízo para todos.

E agora, Miriam, e agora, Kamel, o que dizer?

Afinal, não é um grupo de sem-terra fazendo gritaria na porta do Ministério da Fazenda. São ricos querendo pagar mais impostos pra que não afundem todos no mesmo rio.

Daí complica, né? Como justificar a ladainha que nossa mídia faz todo dia no Bom Dia Brasil e nos jornalões? Como falar mal da tal "esmola" que Lula dá aos pobres?

O que precisa ser entendido sobre nossa imprensa burra e um par de gente preconceituosa do nosso país é o seguinte. Sob a capa das críticas aos programas de distribuição de renda (sempre muito bem fundamentadas, claro. No Mein Kampf) se escondem pessoas classistas, que odeiam a hipótese de repartir, o mínimo que seja, com os miseráveis da periferia. Os restaurantes precisam continuar sendo só deles, as lojas de carro devem vender só pra eles. Por isso desfiam seu veneno todo santo dia na televisão e nos jornais.

Não querem que a economia cresça. A menos que seja a economia deles.

E falam, a mesma ladainha, que o Brasil precisa investir em educação. Curioso que quando o Governo central destinou metade das vagas das universidades federais para alunos oriundos das escolhas públicas, fizeram a maior gritaria.

Claro, quando pedem educação, devem estar falando da educação dos próprios filhos. E de preferência nas boas universidades americanas ou europeias. Certamente não se incomodariam se o governo Federal lhes concedesse esse mimo. Com o dinheiro público, naturalmente.

Educação para pobre? Sim, sim. Desde que seja para ensinar o empregado a se manter calado ao ouvir desaforos e nunca procurar a Justiça Trabalhista quando descobrir que nenhum tostão do FGTS foi recolhido.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

El Gobierno 'de facto' de Honduras demanda a Brasil ante la Corte de Justicia de La Haya

El Ejecutivo de Micheletti estudia pedir una indemnización al de Lula.- Una delegación de EE UU llega al país para mediar

El Gobierno de facto de Honduras ha iniciado hoy los trámites para demandar a Brasil en la Corte Internacional de Justicia de La Haya por "injerencia" en sus asuntos internos al permitir la presencia del derrocado presidente hondureño, Manuel Zelaya, en su embajada en Tegucigalpa. El encargado de iniciar el proceso ha sido el agente de Honduras en La Haya, Julio Rendón, según explica en un comunicado el Ministerio hondureño de Relaciones Exteriores de Roberto Micheletti, que precisa que estudia pedir una indemnización al Ejecutivo de Lula.

Rendón ha presentado "una solicitud introductiva de instancia contra la República Federativa de Brasil por cuestiones jurídicas relativas a las situaciones diplomáticas y al principio de no intervención en los asuntos que son de la competencia interna del Estado" hondureño, dice la nota. Una fuente de la Cancillería (Ministerio de Exteriores) ha explicado que esa acción es una "solicitud para iniciar acciones" contra Brasil, entre ellas pedir ante la corte medidas cautelares o una indemnización del país suramericano. El canciller del Gobierno de facto, Carlos López, ha señalado en rueda de prensa que la Corte Internacional decidirá ahora si admite o no la solicitud.

Una misión de EE UU

López ha indicado que la presencia de Zelaya en la legación brasileña, donde se encuentra desde que regresó al país el pasado 21 de septiembre, y sus llamamientos a la "insurgencia" suponen "una injerencia en las actividades internas de Honduras". El comunicado agrega que el fundamento de la solicitud recae en la "comisión de ilícitos" por parte del Gobierno de Brasil "que generan responsabilidad internacional con relación a sus obligaciones establecidas en la Carta de las Naciones Unidas y en la Convención de las Naciones Unidas sobre Relaciones Diplomáticas".

Subraya, asimismo, que el Gobierno de facto hondureño "se reserva el derecho de solicitar a la Corte la adopción de medidas provisionales o cautelares si no cesan las actividades ilegales del Gobierno de Brasil que alteran el orden público interno de Honduras y que representan una amenaza al desarrollo pacífico del proceso electoral" del 29 de noviembre. El canciller apunta que con esta acción contra Brasil el Gobierno de facto quiere "resolver pacíficamente" este asunto "con la participación de la Corte Internacional de Justicia". Zelaya, derrocado por los militares hace cuatro meses, permanece en la embajada de Brasil junto a su esposa, Xiomara Castro, y unos 40 colaboradores, seguidores y periodistas.

El Gobierno de facto, que no es reconocido ni por la comunidad internacional ni por ninguna organización multilateral, anunció a finales de septiembre, tras la llegada de Zelaya, un ultimátum de diez días a Brasil que finalmente no se tradujo en medidas concretas. El Consejo de Seguridad de Naciones Unidas aprobó una resolución, también a finales de septiembre, en la que condenaba los "actos de intimidación" del Gobierno de Micheletti contra la sede diplomática brasileña. Centenares de militares y policías hondureños rodean la sede diplomática, desde donde Zelaya ha denunciado distintas acciones de hostigamiento por parte de esas fuerzas de seguridad.

Para mediar en el conflicto ha llegado hoy al país una delegación encabezada por el secretario de Estado adjunto para América Latina de EE UU, Thomas Shannon, y el consejero adjunto de Seguridad Nacional de la Casa Blanca para la región, Dan Restrepo. La misión se reunirá hoy mismo con las comisiones de diálogo de Zelaya y de Micheletti. La embajada de Estados Unidos en Tegucigalpa no ha divulgado, de

momento, la agenda de la delegación, y sólo ha emitido un breve comunicado que dice: "La delegación tiene previsto reunirse con representantes de ambas partes para discutir las estrategias e impulsar hacia delante el proceso. Se instará a ambos a mostrar flexibilidad y a que redoblen sus esfuerzos para que la crisis llegue a su fin".

Fonte: ELPAIS.com

Imprensa livre é imprensa privada?

Por Emir Sader

A ideologia liberal – dominante nestes tempos – costuma caracterizar se um país é democrático, pelo seu regime político, fazendo suas perguntas clássicas: se há pluralismo partidário, separação de poderes no Estado, eleições periódicas e imprensa livre. Não contempla a natureza social do país, se há universalização de direitos básicos, se se trata de uma democracia social ou apenas do sistema político.

Um dos problemas dessa visão redutiva que marca o liberalismo, seccionando a esfera político-institucional do resto da formação social, é que vai buscar a resposta no lugar errado. Saber se um país é democrático é saber se sua sociedade é democrática. O sistema político é uma parte dela e deveria estar em função não de si mesmo, mas de criar uma sociedade democrática.

Mas o pior desses critérios é tentar fazer passar que imprensa privada é critério de democracia. Imprensa privada (isto é, fundada na propriedade privada, na empresa privada) como sinônimo de imprensa livre é uma contradição nos termos. Imprensa centrada na empresa privada significa a subordinação do jornalismo a critérios de empresa – lucro, custo-benefício, etc. . etc., a ser financiado por um dos agentes sociais mais importantes – as grandes empresas. O que faz com que a chamada imprensa “livre” seja, ao contrário, uma imprensa caudatária dos setores mais ricos da sociedade, presa a seus interesses, de rabo preso com as elites dominantes.

A chamada imprensa “livre” representa os interesses do mercado, dos setores que anunciam nos veículos produzidos por essas empresas, que são mercadorias, que transformam as noticias e as colunas que publicam em mercadorias, que são compradas e vendidas, como toda mercadoria.

Antes de serem vendidos aos leitores, os jornais – assim como os outros veículos – são primeiro vendidos às agencias de publicidade, que são os instrumentos fundamentais de financiamento da imprensa “livre”. “Um anúncio de uma página em Les Echos (publicação econômica francesa), com tarifa normal, rende mais do que a totalidade de suas vendas nas bancas” – diz Serge Halimi, em artigo no Le Monde Diplomatique de outubro.

São então “livres” de quê? Do controle social, da transparência do seu financiamento, da construção democrática da opinião pública. Prisioneiros do mercado, dos anúncios, das agências de publicidade, das grandes empresas privadas, do dinheiro.

Uma imprensa livre, democrática, transparente, não pode ser uma imprensa privada, isto é, mercantil. Tem que ser uma imprensa pública, de propriedade social e não privada (e familiar, como é o caso das empresas jornalísticas brasileiras).

A Conferência Nacional de Comunicacáo, a ser realizada em novembro, é um momento único para redefinir as leis brasileiras, promovendo a construçãao e o fortalecimento de uma imprensa realmente livre, democrática, transparente, pública.

Da Agência Carta Maior

Máquina mortífera

Uma política de extermínio levada a cabo pela polícia carioca, com apoio de setores da mídia e a omissão do Ministério Público e do Judiciário, vem provocando um verdadeiro genocídio no Rio de Janeiro. Nesta década já foram eliminadas quase 10 mil pessoas, a maioria delas nas favelas da capital
Por Marcelo Salles
Hanry Silva voltava da casa de uma colega, numa favela chamada Boca do Mato, na Zona Norte do Rio de Janeiro. O nome tem sua razão de ser. O lugar dá para uma montanha, no bairro Lins de Vasconcelos, onde a vegetação nativa ainda é preservada. Em vez de retornar pela rua, ele decidiu fazer o trajeto mais curto: pelo alto do morro. Assim, caminhando próximo aos postes de energia do topo da montanha, Hanry cruzou pouco mais que 1 Km. A vista abrevia ainda mais a viagem: com tempo bom é possível ter uma visão panorâmica da cidade, emoldurada pela Ponte Rio-Niterói e pela Baía de Guanabara. Eram cinco da tarde quando se aproximava de sua casa, no Morro do Gambá – também conhecido como Nossa Senhora da Guia.
O estudante já estava bem perto, nem 100m faltavam. Ao chegar, tomar banho, trocar de roupa e seguir para o colégio. Estava de bermuda preta e sem camisa. Vinha balançando a chave de casa, despreocupado, fazendo um caminho ao qual já se habituara. No entanto, aquele 21 de novembro de 2002 seria diferente. Hanry foi surpreendido por policiais do 3º Batalhão de Polícia Militar e arrastado uns 20m abaixo. Foi posicionado entre uma pedra de 2m x 1,5m e um arbusto com folhagem densa e suficientemente grande para encobrir o resto de visão que alguém poderia ter do lugar. A casa mais próxima dali fica a uns dez minutos de caminhada, em mata semifechada.
Por volta de 17h40, um estampido ecoou no Morro do Gambá. Aos dezesseis anos de idade, Hanry foi assassinado com um tiro certeiro no coração. Tinha 1,65m, era mulato, corpo seco. Cursava o primeiro ano do ensino médio – nunca repetiu – e sonhava ser jogador de futebol, como tantos outros garotos.
No dia seguinte sua mãe acordou preocupada. O filho não havia dormido em casa. Márcia Jacintho percorreu a favela toda atrás de notícias, quando teve a ideia de ir ao hospital mais próximo. No Salgado Filho ficou momentaneamente aliviada: apenas dois jovens haviam sido encaminhados pela polícia na noite anterior, ambos descritos como traficantes que já chegaram mortos. Márcia continuava a busca quando alguém ligou do IML: “Vem pra cá porque acho que mataram seu filho”.
Chegando lá, Márcia começou a morrer em vida. A dor é tanta que hoje, quase sete anos depois, ela ainda chora quando recorda a cena: “Meu filho não teve velório. Tava inchado, um cheiro muito forte, muito escuro, ninguém o reconheceu”. Márcia começou a morrer por um lado, mas de outro nasceu uma guerreira que iria lutar com unhas e dentes para fazer justiça. Suas razões de viver passaram a ser basicamente essas: provar que seu filho não era traficante, como acusara a polícia, e responsabilizar os assassinos.
Inicialmente, Márcia fez o trabalho de investigação sozinha, pois a autoridade competente alegava não dispor dos recursos necessários. Então ela voltou ao local do crime, fez a primeira reconstituição com as próprias sandálias, fotografou, encontrou testemunhas. Até o boletim ambulatorial do hospital ela foi pegar, já que a Delegacia de Polícia não se mexia.
Essa história ela me conta enquanto vasculhamos os arredores de onde Hanry foi assassinado. Do pé ao topo, demoramos quase uma hora de subida bastante puxada. O Morro do Gambá tem centenas, talvez milhares de casas, de todos os tipos: alvenaria, madeira, compensado ou tudo misturado. Aqui, a maior parte da população é negra. E pobre. Serviços públicos como coleta de lixo demoram a chegar, deixando o chão imundo, sobretudo nas partes mais altas. Ao lado da pequena quadra de futebol, de terra batida, há um barranco imenso, uns cem metros quadrados de sacos plásticos, restos de comida e sujeira de todo tipo.
Conforme subimos, percebo que o adensamento populacional vai se reduzindo, até que cruzamos a última casa – um compensado de madeira de uns 20m quadrados, no máximo, de onde saem seis pessoas. Uma mulher idosa, uma criança bem pequena e os demais, adolescentes. Márcia arrisca o caminho da esquerda, mas o mato está muito fechado. “Tem certeza que é aí?”, pergunto. “É sim, é que não venho aqui faz tempo”. Continuo seguindo, meu receio em franco contraste com o seu destemor. Até que um dos adolescentes da última casa, um negro bem preto, se aproxima e fala: “Tia, não é por aí, não. É pelo outro lado”. E nos mostra o caminho.
Passaram-se dois anos e nove meses até que a perícia oficial agisse. A partir daí, apareceram várias contradições na versão dos policiais, que alegaram, por exemplo, troca de tiro com bandidos que estariam em cima de uma pedra, levando a crer que o disparo teria vindo de baixo para cima (e não o contrário, como foi comprovado pelo laudo cadavérico). O horário alegado pelos policiais também não batia. Como poderia haver uma troca de tiros às 19h40 no alto do morro se a entrada do garoto no hospital teria sido às 20h08? Seria como enfrentar seis ou sete bandidos fortemente armados, como argumentaram os policiais, recolher o corpo baleado, descer o morro inteiro carregando o fardo, colocá-lo na viatura e deixá-lo no hospital, que fica a vinte minutos dali. Nem o The Flash.
Seis anos depois, Márcia conseguiu levar a julgamento dois dos onze policiais militares que havia acusado. Marcos Alves da Silva foi condenado a nove anos de prisão por homicídio doloso e fraude processual (simulou apreensão de arma e droga com Hanry) e Paulo Roberto Paschuini a três anos pelo último crime. Os dois vão recorrer,
sendo que o segundo em liberdade.
O caso de Hanry foi um dos 9.179 óbitos registrados como “autos de resistência” – quando a polícia mata um opositor em legítima defesa – entre 2000 e 2009 (até maio), de acordo com o Instituto de Segurança Pública, órgão vinculado ao Executivo Estadual. Uma média de 2,67 mortes por dia. É como se em dez anos toda a população do bairro da Glória sumisse do mapa. Por outro lado, foram registrados 59.949 homicídios dolosos, no mesmo período; crimes que o Estado não foi capaz de evitar.
O número de “autos de resistência” dá à polícia do Rio o título de campeã de letalidade. Entre todas as outras corporações similares no mundo, é a que mais mata – e também a que mais morre (dado que, por si só, evidencia uma política de segurança equivocada). Até o relator da ONU para execuções sumárias e extrajudiciais, Philip Alston, declarou, após recente visita ao Rio de Janeiro: “no Brasil os policiais matam tanto em serviço como fora de serviço e nenhuma investigação é feita já que todos os índices se justificam a partir de ‘autos de resistência’ ou ‘mortes em confronto’”.
A origem da ferramenta jurídica “auto de resistência” está na Ordem de Serviço “N”, nº 803, de 2/10/1969, da Superintendência da Polícia Judiciária, do antigo estado da Guanabara. O dispositivo afirma que “em caso de resistência, [os policiais] poderão usar dos meios necessários para defender-se e/ou vencê-la” e dispensa a lavratura do auto de prisão em flagrante ou a instauração de inquérito policial nesses casos.
Registre-se: não são raras as situações em que os policiais necessitam usar a força como resposta a ações hostis de traficantes varejistas. É como explica o delegado Marcus Nunes, coordenador da CORE, unidade de elite da Polícia Civil: “Somos muitas vezes recebidos a tiros. Geralmente o policial entra numa comunidade em tese hostil porque é controlada por um grupo fortemente armado, querendo fazer de tudo pra não ser preso, usando todos os esforços necessários, às vezes com equipamentos de primeira geração, munição em fartura, granadas”. No entanto, como reconhece o delegado, essa situação de extrema pressão sobre o policial, aliada a outros fatores, pode levar a execuções registradas como autos de resistência.
“Me chamava a atenção a diferença no preenchimento dos ROs [Registros de Ocorrência]”, comenta a antropóloga Ana Paula Miranda, que foi diretora-presidente do Instituto de Segurança Pública. Por um lado, havia falta de cuidado nos registros em geral, mas aqueles referentes aos autos de resistência “vinham bem montados, com informações padronizadas e a falta de testemunhas que não fossem policiais”, diz a pesquisadora da Universidade Federal Fluminense. Ana Paula chama a atenção para a escalada da violência da polícia, que cada vez mata mais e prende menos (ver quadro na página 31).
A polícia do Rio de Janeiro atua com muito pouco controle, interno ou externo. A Corregedoria nem sempre atua com a isenção desejada, as armas utilizadas em operações dificilmente são identificadas e os policiais que se envolvem em troca de tiros não recebem atenção especial do governo – em outros Estados, como São Paulo, já existe uma política assistencial voltada para esses profissionais da segurança, como auxílio psicológico. No entanto, engana-se quem acredita que a polícia é a única responsável pelo atual estado de coisas. Quando se registra uma ocorrência como “auto de resistência”, o delegado tem trinta dias para investigar e, então, deve enviar suas conclusões para o Ministério Público Estadual.
O MP é o titular da Ação Penal e, diante do relatório, o promotor deve decidir se retorna o material para a delegacia solicitando novas apurações, se oferece denúncia contra o policial ou se encaminha o processo com pedido de arquivamento para o juiz. Neste caso, se o magistrado concordar, o processo é arquivado. Se discordar, a decisão final passa à Procuradoria Geral de Justiça, cujo titular é indicado pelo governador do Estado.
Para esclarecer os dados, procurei o Ministério Público. Fiz o primeiro contato no dia 17 de agosto. Na assessoria de imprensa, fui atendido por Paolla Serra, depois por Lívia Monteiro. Não me deram retorno. No dia 14 de setembro, voltei a insistir. Dessa vez falei com Leonardo, que também não me respondeu. Alguns dias antes eu havia ido ao Tribunal de Justiça, onde conversei com três defensores públicos. Eles disseram que recebem pouquíssimos inquéritos em casos de autos de resistência, às vezes nem um por mês, o que indica poucas denúncias do MP contra policiais.
O pioneiro a analisar os pareceres do Ministério Público sobre os autos de resistência foi o desembargador Sérgio Verani, no livro “Assassinatos em nome da lei” (entrevista à página 31). Na apresentação da obra, o jurista Evandro Lins e Silva anota: “Examinando dezenas de inquéritos, alguns deles em que funcionou como juiz, Sérgio Verani pôde identificar uma uniformidade ideológica que conduziu ao arquivamento ou à absolvição, em todos eles, dos policiais acusados do assassinato de 42 pessoas”. Nesta cesta ideológica encontra-se o pedido de arquivamento, assinado por um promotor, que classifica a vítima da ação policial como “micróbio social”. O caso é de 1982, mas permanece atual. Vinte e dois anos depois, a 21a Promotoria de Investigação Penal de Bangu acusou os bandidos que teriam enfrentado a polícia de “verdadeiros soldados do mal”.
“No ano passado aquele comandante [coronel Marcos Jardim] de certa forma repetiu isso: ‘[a PM é o melhor] inseticida social’. Inseticida social!”, recorda Sérgio Verani: “Como também uma expressão usada quando foi preso o Elias [Maluco, acusado de matar o jornalista Tim Lopes]. E aí foram expedidos mandados de busca e apreensão e
o juiz escreveu na decisão dele que o Grupo do Elias era um ‘lixo genético’. O juiz escreveu isso: ‘lixo genético’! Que é a mesma coisa de ‘micróbio social’, ‘inseticida’. O desprezo com a vida. Uns podem viver, mas esses desclassificados não”.
“Quem mata é a Polícia, mas quem enterra é o Judiciário”
Outro indicativo de descaso do Poder Judiciário é que em muitas sentenças o magistrado abre mão do despacho fundamentado e passa a usar uma mera etiqueta adesiva, tipo essas da marca Pimaco, para determinar o encerramento do processo investigatório. Como consta da decisão assinada em 10 de janeiro de 2005, a respeito de três mortes causadas por policiais na favela do Rebu, em Senador Camará: “Na forma de promoção do MP de folhas retro, determino o arquivamento do presente feito. Dê-se baixa e arquive-se”.
Por essas razões, o delegado de Polícia Civil Orlando Zaccone, mestre em Ciências Penais, não tem dúvidas em afirmar: “Quem mata é a polícia, mas quem enterra é o Judiciário”. Profundo conhecedor da Criminologia Crítica, Zaccone alia a teoria à prática. Foi ele quem conduziu as investigações que solucionaram a Chacina do Borel, em 2003, em que os crimes foram inicialmente registrados como autos de resistência. É com essa autoridade que ele analisa: “O que vai definir o arquivamento dos autos ou o processo dos policiais pela morte da vítima é se a vítima está ou não definida como ‘inimigo’, traficante, gerando uma ‘legitimidade’ na ação da polícia”.

Marcelo Salles é jornalista e coordenador da Caros Amigos no Rio de Janeiro
salles@carosamigos.com.br

Da Revista Caros Amigos

STF manda Senado cassar tucano

STF manda Senado cassar imediatamente mandato de Expedito Júnior
É esse tipo de gente que faz parte do PSDB.
Folha Online, em Brasília

Por 7 votos a 1, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta quarta-feira que o Senado deve confirmar imediatamente a perda do mandato do senador Expedito Júnior (PSDB-RO), decretada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por compra de votos e abuso do poder econômico durante as eleições de 2006.

Expedito disse que ainda não tem conhecimento da decisão e que prefere conversar com seus advogados, que acompanharam o julgamento no STF, antes falar sobre o assunto.

Apesar da decisão do TSE ter saído em junho, uma determinação da Mesa Diretora do Senado resolveu segurar o mandato do senador até que terminassem todas as chances de recurso.

Os ministros do STF acolheram o mandado de segurança apresentado pelo segundo colocado na eleição de 2006 para senador por Rondônia, Acir Gurgacz (PDT.

O relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski, disse que não há previsão legal para que a decisão do TSE seja protelada.

O ministro Celso Mello criticou a resistência do Congresso. "É inaceitável que as Mesas das Casas do Congresso não cumpram decisões emanadas do TSE. O Supremo disse claramente que as decisões emanadas na Justiça Eleitoral hão de ser cumpridas, independentemente de seu trânsito em julgado", afirmou.

Aparição de Serra em programa do DEM gera polêmica no partido



O presidente do Democratas, Rodrigo Maia, quer vetar a participação do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), em um programa do DEM. O tema teria gerado polêmica entre o Democratas, segundo afirma o jornal Folha de S. Paulo desta terça-feira.(aqui assinante e tem aqui para quem não assina)

O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, teria incluído em seu espaço no programa imagens ao lado de Serra. Para Maia, o programa deve ser usado apenas para divulgar o trabalho de seu partido. "Nunca foi cogitada a participação de tucanos, até porque seria ilegal", disse Maia à Folha.

Ao discutir o assunto, Maia teria pedido a Kassab que vetasse as imagens de Serra, porque o governador de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB), não teria espaço no programa.

O deputado democrata gaúcho Onix Lorenzoni defendeu que apenas políticos do DEM deveriam ter espaço no programa.O programa será apresentado por Maia e deve ir ao ar na próxima quinta-feira.

Do blog Os Amigos do Presidente

O mito do orgulho argentino

Do blog do Eduardo Guimarães,(Cidadania.com)
Nós, brasileiros, trazemos na memória uma impressão desse grande povo argentino que deixou de corresponder à realidade há muito tempo, o mito de seu exacerbado orgulho. Pode ter sido verdade, mas num passado distante. A Argentina sofreu tanto nas últimas décadas que, hoje, o que se percebe por aqui é uma tremenda baixa auto-estima.Nos últimos quase trinta anos, os argentinos vêm sofrendo humilhações sucessivas que fizeram com que perdessem totalmente o orgulho acerbo de seu país que, em minha opinião, não só era justificável antigamente como continuaria sendo até hoje, se persistisse.A primeira grande humilhação desse período foi a derrota acachapante para a Grã Bretanha na Guerra das Malvinas. Depois, vieram os anos de surtos inflacionários que praticamente destruíram a economia do país, culminando com a crise do “corralito” do início deste século.Enquanto que ontem esse povo falava maravilhas de si, hoje é difícil encontrar um argentino que não maldiga seu país e seu povo, o que, a meu ver, é injustificável, pois se trata de um povo culto, com o segundo melhor padrão de vida da América Latina – o Chile tirou deles o primeiro lugar no ranking do IDH.E vou lhes dizer, eles nos tratam, aos brasileiros, como irmãos. Pelo menos é o que sinto. Admiram nosso país. E os vejo humildes, mais até do que deveriam, ainda que humildade nunca seja demais.Hoje, porém, sou obrigado a tecer loas à gastronomia deste país, com suas carnes, doces e vinhos... Em três dias de intensa gastronomia portenha, devo ter ganhado uns bons quilinhos extras. Con mucho gusto.

Bessinha - chargeonline

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Condenados - Editora Abril e Roberto Civita

Editora e jornalista pagarão R$ 30 mil a Collor por dano moral

O senador e ex-presidente da República Fernando Collor de Mello (PTB-AL) receberá da editora Abril e do jornalista Roberto Civita R$ 30 mil de indenização por danos morais, de acordo com a decisão da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Em reportagem da revista Veja publicada em julho de 2004, o senador e mais cinco pessoas são acusadas de participarem de um esquema de corrupção batizado de "Esquema PC".

Collor alegou que teve honra e imagem maculadas devido à publicação. A reportagem fez referência também à apreensão, pela Polícia Federal, do computador do então tesoureiro PC Farias, morto em 1996, onde havia organograma detalhando como funcionava a estrutura do esquema.

Ainda segundo a matéria, no topo do gráfico que estava no computador estavam as palavras "big boss", apelido pelo qual Collor era chamado pelos demais membros da quadrilha. Durante o julgamento no qual o ex-presidente foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 1994, a descoberta do esquema não foi admitida como prova, já que foi obtida sem autorização judicial.

A relatora do processo, desembargadora Nanci Mahfuz, destacou que mesmo que assegurada a liberdade e afastada a censura dos meios de comunicação pela Constituição Federal, a imprensa não pode emitir comentários e opiniões que venham a atingir a honra das pessoas.

"É bem verdade que o autor se viu envolvido em fatos que causaram grande repercussão e comoção pública, mas foi ele absolvido pelo Judiciário. Ainda que seja por falta ou invalidade das provas, não pode a imprensa substituir o poder competente para julgá-lo, tratando-o como corrupto. Misturar no mesmo contexto pessoas condenadas e absolvidas, ainda que para comentar a dificuldade de apuração de corrupção, é ofensivo à honra e à dignidade", escreveu em seu voto.

Segundo a desembargadora, pessoas públicas estão sujeitas a críticas e avaliações, e não podem se considerar ofendidas pela imprensa no seu dever de informar. Entretanto, argumenta a magistrada, a imprensa deve respeitar os limites da liberdade, não praticando ofensa ao direito à honra e à dignidade, também garantido pela Carta Maior.

"Se a notícia ou reportagem imputa crime a quem foi absolvido e deseja reconstruir sua vida, superando episódio nefasto, é de se reconhecer a dor moral", afirmou.

Do blog do Júlio Falcão

Vídeo: a “Excelência”, o “Nobre colega” e o apêndice duro e recurvo que floresce a fronte de alguns animais

Cimento, cocaína e um colunista ensandecido

Escrito por Luiz Antonio Magalhães
16-Abr-2009

Diogo Mainardi adora provocar polêmica. Nem sempre é feliz: algumas vezes consegue criar enorme barulho, em outras passa apenas despercebido. Ironia e sarcasmo são algumas das armas que o colunista da revista Veja sempre utiliza para tentar obter o efeito desejado. Quem acompanha os escritos de Mainardi conhece bem suas
posições políticas, tão explicitamente alardeadas e que podem ser sintetizadas na confissão do próprio colunista, em um texto publicado em agosto de 2005: "Quero derrubar Lula". É simples assim, não tem jeito de não entender.

Na edição corrente de Veja (nº 2108, com data de capa de 15/04/2009), Mainardi volta a citar o presidente da República no título de sua coluna, reproduzida ao final deste artigo. "O Lula shakespeariano" poderia ser apenas um texto cômico, uma piada meio sem graça, dessas que nem todo mundo entende. Talvez a melhor coisa seja não levar a sério o que diz o colunista, como se faz com as brincadeiras às vezes bem agressivas dos palhaços de circo. Em certos casos, porém, vale a pena entrar no jogo de Mainardi - por trás das ironias e das palavras bem escolhidas está uma ideologia consumida pelos milhões de brasileiros que assinam ou compram Veja nas bancas.

No texto em questão, a ironia de Mainardi é dirigida ao corte do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) em alguns produtos, em especial o cimento, que o jornalista considerou pequeno. Tal ironia pode ser compreendida na comparação feita entre a medida tomada por Lula em relação ao IPI e o esforço de Barack Obama para recuperar a economia dos Estados Unidos - segundo Diogo Mainardi, o presidente norte-americano "está aumentando o déficit público, num prazo de dez anos, em cerca de 6 500 000 000 000 de dólares (com todos os zeros)", ao passo que Lula teria conseguido reduzir "o custo do saco de 25 quilos de cimento em cerca de 40 centavos (com todos os zeros)".

Até aqui, nenhum problema, certos analistas econômicos meio chinfrins que se lêem por aí devem até concordar com a mui justa comparação de Mainardi. IPI brasileiro e déficit público americano, tudo a ver. Mas vamos em frente.

O que vem na sequência de tão estapafúrdia comparação é que realmente choca no texto de Mainardi: "No Brasil, ao contrário, o corte do IPI do cimento ajudará, indiretamente, uma indústria próspera: a do comércio de drogas. Em primeiro lugar, estimulando o crescimento das favelas. Encasteladas nos morros, elas correspondem, para os traficantes, às fortalezas medievais: Comando Vermelho e William Shakespeare. Em segundo lugar, subsidiando a cocaína. Algumas semanas atrás, o Globo mostrou que os traficantes da Rocinha (o rei do tráfico - o Henrique IV da Rocinha - é conhecido como Nem) misturam cimento à cocaína. O que fez o governo? Zerou o IPI da cocaína por três meses, garantindo uma economia de 40 centavos a cada 25 quilos. Isso sim é uma medida anticíclica", escreveu o colunista de Veja.

Favelado é traficante

É muito raro ver tanto preconceito junto em um só parágrafo. Na verdade, é realmente incrível que tamanha sandice tenha sido publicada. Sim, trata-se de um texto humorístico e no humor vale qualquer coisa, mas o que vai acima não chega a ter muita graça, lembra as piores e mais infames piadas racistas. Em menos de dez linhas, Mainardi reforça as idéias de que quem mora na favela é traficante, de que é preciso conter o crescimento das favelas e o de que o problema do tráfico de droga está no traficante, e não na sociedade. Tudo isto para não falar da risível acusação ao governo Lula, qual seja a de subsidiar o tráfico por meio da redução de impostos para... cimento. Aí realmente não dá nem para levar a sério, é apenas uma piada nonsense.

Analisando um pouco mais a fundo, estão presentes no texto de Mainardi alguns dos chavões que a classe média brasileira mais gosta, porque jogam no colo do governo problemas sociais bastante complexos e de difícil solução - a questão da droga e da favelização dos grandes centros urbanos. Diogo Mainardi reforça sutilmente a idéia de que a solução é "jogar uma bomba nos morros e acabar com os favelados", tão presente no discurso nem sempre tão envergonhado de certa classe média ultradireitista. Também com a mesma "sutileza" o colunista procura vincular o presidente Lula aos dois pólos negativos de seu texto - drogas e favelas -, apresentando-o como um aliado dos traficantes e dos pobres habitantes dos morros. Assim, fecha-se o círculo: ideal mesmo seria "jogar uma bomba nos morros com o Lula e toda a sua corja lá dentro" - mata-se os traficantes e de quebra devolve-se o país ao governo dos homens bons.

Mainardi gosta de fazer graça e há quem ria das suas brincadeiras, mesmo sem entender direito o que conduz o tipo de humor que o colunista é (bem) pago para fazer. A liberdade de expressão evidentemente comporta este tipo de texto, como suportava, em priscas eras, os editoriais ("Basta!" e "Fora!", no Correio da Manhã) que pediam exatamente o que Diogo Mainardi já pediu em 2005: a derrubada de um governo – constitucionalmente eleito, diga-se de passagem. Se é para rir, melhor pelo menos entender a piada.

***

O Lula shakespeariano

Diogo Mainardi: reproduzido de Veja, 15/04/2009

Lula e Barack Obama confraternizaram no G-20 como Falstaff e o Príncipe de Gales no H-4 – ou Henrique IV.

Ato I, cena II:

Falstaff – Que horas são, rapaz?

Príncipe – Embruteceste de tal modo, à força de beber xerez, de desabotoar-te depois da ceia e de dormir à tarde sobre os bancos, que esqueces de perguntar o que realmente mais importa saberes. Que diabo tens tu que ver com o tempo?

Falstaff – o Falstaff shakespeariano – é obeso, barbado, embriagado, ocioso, medroso, mulherengo, traidor, desonesto. Ele anima as noitadas do Príncipe de Gales com seus planos para roubar as bolsas dos peregrinos. O Príncipe de Gales só se aborrece quando Falstaff é infiel à sua imagem de fanfarronice, como na passagem em que pergunta, distraidamente, as horas.

Lula – isso mesmo, o Lula shakespeariano – animou as noitadas de Barack Obama durante o G-20. Quando perguntou as horas, ninguém respondeu. O Brasil representa o elemento de comicidade nesses encontros internacionais, a taberna suja e barulhenta que contrasta com o rigor puritano do Castelo de Westminster. A trama que "realmente mais importa", na qual se decide o destino da Inglaterra, se desenrola em outras cenas, em outros ambientes, com outros protagonistas.

Concretamente, em números, como as horas no mostrador de um relógio: Barack Obama, para tentar restabelecer a economia dos Estados Unidos, está aumentando o déficit público, num prazo de dez anos, em cerca de 6 500 000 000 000 de dólares (com todos os zeros); Lula, para tentar restabelecer a economia do Brasil, cortou o IPI de alguns produtos por um prazo de três meses, reduzindo o custo do saco de 25 quilos de cimento em cerca de 40 centavos (com todos os zeros).

Os majestosos pacotes fiscais de Barack Obama prometem enterrar os Estados Unidos, financiando uma série de indústrias falidas. No Brasil, ao contrário, o corte do IPI do cimento ajudará, indiretamente, uma indústria próspera: a do comércio de drogas. Em primeiro lugar, estimulando o crescimento das favelas. Encasteladas nos morros, elas correspondem, para os traficantes, às fortalezas medievais: Comando Vermelho e William Shakespeare. Em segundo lugar, subsidiando a cocaína. Algumas semanas atrás, o Globo mostrou que os traficantes da Rocinha (o rei do tráfico – o Henrique IV da Rocinha – é conhecido como Nem) misturam cimento à cocaína. O que fez o governo? Zerou o IPI da cocaína por três meses, garantindo uma economia de 40 centavos a cada 25 quilos. Isso sim é uma medida anticíclica. O Globo mostrou também que, em nossa taberna falstaffiana, suja e barulhenta, adolescentes com pouco mais de 25 quilos de peso se prostituem por 1,99 real. Sem IPI.

Em Henrique IV, o Príncipe de Gales, depois de assumir o trono, repudia Falstaff. Ei, Lula: agora são 11h53.

Luiz Antonio Magalhães é diretor executivo do Observatório da Imprensa, onde este texto foi originalmente publicado.

Blog do autor: http://www.blogentrelinhas.blogspot.com

terça-feira, 27 de outubro de 2009

País pobre perde até 89% dos trabalhadores com curso superior

Guiana, Haiti e Granada estão entre os locais nos quais mais de 80% dos que atingem o nível superior se mudam para trabalhar no exterior.

Por Tiago Mali, do Pnud

Em Guiana, que faz fronteira com Roraima e Pará, de cada dez pessoas que terminam a faculdade, nove deixam o país.

Quadro semelhante foi constatado em Granada e na Jamaica (8,5 em cada dez), no Haiti (8,4) e em pequenos países africanos e asiáticos, aponta o estudo Fluxo de Capacidade: Uma Reconsideração Fundamental da Mobilidade dos Trabalhadores Capacitados e o Desenvolvimento.

O trabalho faz parte de uma série de pesquisas que subsidiaram o RDH (Relatório de Desenvolvimento Humano) de 2009, intitulado Ultrapassar Barreiras: Mobilidade e desenvolvimento humanos.

O documento aponta que as nações menores e mais pobres são as que mais sofrem com a fuga de cérebros. “Sabendo que esses países também concentram os piores índices educacionais e o menor número de trabalhadores com nível superior, esse tipo de mão-de-obra está deixando precisamente os lugares onde ela é mais escassa”, afirma o texto do pesquisador Michael A. Clemens.

No total, elenca o estudioso, 81 países têm pelo menos 15% de seus cidadãos formados vivendo fora, e em 34 dessas nações a proporção supera um terço. O estudo foi feito com dados de 2000 referentes a 173 países-membros da ONU.

A lógica verificada mundialmente se repete no interior de países de grande extensão, como o Brasil. Cálculos feitos pelo pesquisador com base em dados do Censo de 2000 mostram uma tendência de a população brasileira com nível superior deixar Estados pequenos e pobres, como o Acre e Piauí, e permanecer em populosos e ricos, como São Paulo e Rio de Janeiro.

Uma das principais razões para esse movimento é o abismo salarial entre os países desenvolvidos e o restante. “Um desenvolvedor de software na Índia pode triplicar seus ganhos reais ao mudar para os Estados Unidos; um médico da Costa do Marfim pode multiplicar seu salário por seis se for trabalhar na França”, afirma o texto. Por ganho real, entenda-se o salário ajustado pela paridade do poder de compra, que elimina a diferença de custo de vida entre os países.

Outros fatores

A desigualdade salarial, entretanto, não é o único fator que contribui para que as pessoas com maior instrução deixem países pobres. Conflitos armados, falhas nas instituições, corrupção, condições de trabalho precárias, poucas oportunidades de se aprimorar profissionalmente e repressão política também influenciam.

Para mostrar como a questão vai além do salário, Clemens deteve-se sobre o período de maior fuga de cérebros de algumas nações. A análise mostra que na Etiópia, por exemplo, o aumento da saída de formados coincidiu com a ascensão de uma junta militar marxista chamada Derg (de 1974 a 1991), que antecedeu uma violenta guerra civil.

De forma semelhante, a fuga de cérebros cresceu na Libéria durante a ditadura de Samuel Doe (1980 a 1990) e o regime violento de Charles Taylor (1997 a 2003). Uganda também registrou maior crescimento durante instabilidades do governo na década de 80 e o Zimbábue a partir da crise econômica no mandato de Robert Mugabe (no início da década de 90).

Barreiras

O estudo afirma que se formou um consenso de que a fuga de pessoas com nível superior tem papel prejudicial, particularmente na saúde. Agências da ONU como a UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento) fizeram alertas nesse sentido, e um dirigente da Associação Médica Britânica chegou a classificar a emigração de profissionais da área como “estupro dos países mais pobres”. Um especialista chega a sugerir que aqueles que recrutam profissionais de saúde desses países deveriam ser julgados por crimes contra a humanidade.

Esse tipo de pensamento fez com que os britânicos durante muitos anos não divulgassem vagas de trabalho para países em desenvolvimento e que a UNCTAD recomendasse que políticas fossem criadas para reduzir esse fluxo, comenta Clemens. O trabalho do pesquisador, entretanto, contesta a visão de que os profissionais mais capacitados de países pobres devem ser controlados para não “fugirem”.

Mesmo que não houvesse fluxo migratório, as nações em desenvolvimento ainda sofreriam com a falta de profissionais de saúde, segundo estudos da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico). “Essa e muitas outras razões explicam o porquê de um maior número de médicos e enfermeiras que emigram de um país africano não estar diretamente relacionado com menores índices de saúde daquela nação”, afirma.

Outra das razões, segundo o texto, é que não há estudos que provem — e nada garante — que, ficando no país, os especialistas vão se dedicar à população menos favorecida e mais carente. “No Quênia, apenas 8,3% da população vive na capital Nairóbi, mas 65,8% dos médicos estão concentrados lá. Em Moçambique, apenas 8% da população mora na capital Maputo, que abriga 51% dos médicos do país”, argumenta.

Propostas

Clemens cita algumas boas práticas para combater as causas da fuga de cérebros. Entre elas, está ampliar incentivos ou prêmios para melhorar a qualidade dos serviços e fazê-los chegar a regiões rurais.

O autor cita pesquisas que mostram que gratificações de menos de 1% sobre o salário já são suficientes para fazer com que médicos comecem a se mudar para localidades rurais. Da mesma forma, pequenas gratificações por qualidade dos serviços melhorariam a situação da saúde ao mesmo tempo em que diminuiriam a opção por sair do país.

Outra ação tomada por alguns países que pode funcionar, diz o estudo, é proporcionar bolsas de estudo e empréstimos para aqueles que querem estudar em centros universitários fora do país, com a contrapartida de que, após a conclusão da faculdade, essas pessoas possam pagar ao governo voltando e trabalhando no país de origem. Desburocratizar o exercício de certas profissões e incentivar centros de excelência também pode ajudar.

Do Portal Vermelho.org