quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Miguel do Rosário e a pesquisa Sensus

Do blog do Azenha(viomundo)

por Miguel do Rosário, no Óleo do Diabo

Em primeiro lugar, acho temerário e, pior, sinal de medo, qualquer gritaria precipitada contra fraude nas pesquisas. Quer dizer, tirando o Datafolha, que merece realmente ser posto de lado, em função dos graves desvios éticos da empresa jornalística a qual é ligado, é interessante usarmos outros institutos de pesquisa para enxergar a situação eleitoral com mais clareza. Mesmo que achemos que ele erre para o lado do adversário (o que não é minha opinião), devemos considerá-lo com atenção. O máximo que pode acontecer é a Dilma Roussef elaborar estratégias de campanha mais consistentes e realistas, enquanto o outro, o candidato dos demo-tucanos, agirá similarmente ao Hitler da paródia que Joel Bueno criou a partir de uma cena do filme A Queda. Não acredito em voto de manada numa eleição plebiscitária como será a de 2010.

Nesta terça-feira, o instituto Sensus divulgou sua pesquisa regular sobre a popularidade do governo e do presidente e sobre as intenções de voto para 2010. Em relação à popularidade, os números continuam francamente favoráveis à Lula. Houve uma ligeira queda de 4,5% na aprovação, mas os índices permanecem em patamar tão extraordinário, bem acima dos níveis registrados em quase todo o primeiro mandato, que reclamar disso, ou apontar como um fato negativo, é uma heresia. Uma leve oscilação para baixo revela que a popularidade de Lula parece ter atingido um teto na última pesquisa, o que não deixa de ser positivo, pois confere um ar mais realista aos dados e serve de belisco no ego de Lula - o que é ótimo para estimulá-lo a continuar tomando medidas que beneficiem a maioria da população brasileira.

No site do CNT-Sensus, encontramos dois arquivos. O resumo pronto das pesquisas e o "relatório de cruzamento", com detalhes da pesquisa que considerei sumamente interessantes, tanto que elaborei uma tabela simplicada com os mesmos, pondo lado a lado os dois principais adversários e prováveis candidatos em 2010: Dilma e Serra.

Sobre Dilma, vale observar que ela já se consolidou como a mais perigosa adversária de José Serra para as eleições do ano que vem. Nunca tendo participado de nenhuma eleição, portanto sem nenhum recall, ela já supera, com folga, nomes nacionalmente conhecidos, como Ciro Gomes, Heloísa Helena e Aécio Neves. Aliás, a surra que Dilma está dando em Aécio é impressionante e deverá sepultar de vez a possibilidade de nosso playboy-mor bater Serra como candidato do PSDB em 2010.

Eu acho que é melhor, para Dilma, disputar eleições com José Serra, porque é um candidato mais vinculado ao governo de Fernando Henrique Cardoso, que foi, apesar de todo oba-oba da mídia nacional, um dos presidentes com piores níveis de popularidade da história recente.

Vamos aos números. Dê uma olhada geral na imagem abaixo e depois volte aqui, para analisarmos juntos alguns pontos.

cnt_sensus.jpg

Dilma Roussef não é um poste eleitoral. É uma mulher de personalidade forte, com uma competência administrativa reconhecida inclusive por seus adversários, e que já mostra, nas pesquisas, uma independência crescente de seu padrinho, o presidente. Por exemplo, à diferença de Lula, cuja popularidade cai junto aos segmentos mais escolarizados (embora mantenha uma sólida liderança também nesse setor), a candidata Dilma Roussef está ganhando muita força junto aos eleitores com bacharelado e renda alta. Diante de Dilma, o governador de São Paulo perde votos do eleitor mais culto. Segundo o Sensus, as intenções de voto em Dilma e Serra, entre eleitores com curso superior, ficaram em 20,5 e 33,3%, respectivamente - uma diferença de apenas 12,8 pontos percentuais, muito acima da vantagem de Serra entre os eleitores que gozam apenas do nível primário, que foi de 21%.

Quando passamos para o capítulo Renda, outra surpresa. Também diferentemente de Lula, a popularidade de Dilma cresce junto com a renda dos eleitores. Entre os cidadãos que ganham mais de 20 salários mínimos, Dilma conseguiu 22,7% das intenções de voto, contra 34% de Serra, uma diferença de apenas 11%. Ou seja, curiosamente, a classe alta brasileira não é assim tão serrista como se pensava. Entre os eleitores com renda acima de 20 salários, Serra tem seu pior desempenho, 34% das intenções de voto. A maior vantagem de Serra encontra-se na classe média média ou média alta, que ganha entre 10 e 20 salários mínimos: neste segmento, Dilma tem 15,8% das intenções de voto, versus 41,4% de Serra, perfazendo uma diferença de 25,6 pontos percentuais.

Não se pode afirmar, peremptoriamente, que esses dados são bons ou ruins para Dilma. Tenho a impressão que são bons, porque se ela está conseguindo conquistar os eleitores mais escolarizados e com maior poder aquisitivo, ela e Lula encurralarão a imprensa oposicionista, pois as classes médias, por um lado, tendem a seguir a opinião dos mais ricos e o povão, por outro, provavelmente tenderá a votar na candidata apontada por Lula. A boa performance junto aos mais ricos também facilitará a obtenção de financiamentos de campanha, um fator que nunca se deve subestimar.

A constatação de que Dilma tem simpatia da turma chique não significa, porém, que ela seja identificada como "candidata dos ricos", ou mesmo que ela apresente uma plataforma política que benefície os privilegiados. Ao contrário, as posições políticas de Dilma são bem claras em favor de uma orientação governamental de esquerda, com prioridade para políticas que beneficiem as camadas mais humildes.

No entanto, Dilma possui, de fato, linguagem, postura e imagem muito pouco associadas ao povão, como é o caso de Lula; seguramente estes são os fatores por trás dessa "originalidade" de Dilma em relação ao presidente. A vantagem é que, sendo grandes consumidores de produtos culturais, aí incluindo jornais e revistas, os eleitores de Dilma da classe alta tem um poder de fogo que os humildes não tem: podem causar (e estão causando) grande estrago nas finanças da mídia oposicionista, tão-somente cancelando assinaturas. Falta agora as agências de publicidade perceberem esse fenômeno e deixarem de anunciar na imprensa reacionária.

*

Alguns analistas, entre eles o jornalista Luiz Carlos Azenha, arriscaram afirmar que a aparente estagnação de Dilma nas pesquisas, em relação à última, divulgada em março, comprovaria a vitória da mídia oposicionista em sua campanha diária contra a candidata. Não concordo plenamente com isso. Certamente, as notícias negativas sobre a candidata e o silêncio obsequioso em relação à Serra, não ajudaram, e creio que deve mesmo ter influenciado. Sou da opinião, no entanto, que Dilma parou de crescer por ter atingido uma certa plenitude junto às classes mais "bem informadas". A estagnação dela reside justamente nas camadas mais baixas, onde Lula reina soberano, e onde a informação de que ela é a candidata do Lula ainda está sendo disseminada e consolidada. De certo, se a rede Globo, e outros canais, divulgassem com mais ênfase essa informação (o que não seria nenhum crime eleitoral, mas simplesmente contar a verdade), poderíamos assistir, como diria Mao, "o grande salto" da Dilma.

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